O coronavírus se espalhou mais
rapidamente em núcleos urbanos densos, resultando em mais mortalidade do que
nas áreas rurais. Tendo desenhado o diagrama do comportamento do vírus e sua
propagação nas cidades, percebemos que, além de uma crise sanitária, o que
vivemos hoje é também uma crise de design, da forma como planejamos e
construímos nossas cidades e habitações.
A crise pandêmica que afetou o
mundo é muito mais do que uma crise sanitária. Cidades superpovoadas, o
transporte de pessoas e mercadorias por longas distâncias, bem como o aumento
de pacientes com deficiências respiratórias devido à poluição ambiental ou
interna têm sido as principais causas do crescimento exponencial do novo vírus.
A Covid-19 mudou tão rápido quanto os bens de consumo mudam de uma parte do
mundo para outra. E se espalhou mais rapidamente em cidades densas, resultando
em uma taxa de mortalidade mais alta em comparação com as áreas rurais.
A elevada densidade das cidades e
a procura do maior benefício imobiliário possível, antes da qualidade do
espaço, têm levado também à existência de um grande número de edifícios
"doentes" e sobrelotados. Unidades domésticas, residências e
quarteirões urbanos inteiros que não possuem orientação adequada, exposição
solar e ventilação natural resultam em um efeito adicional ao do vírus: a
deterioração da saúde física e mental das pessoas por estarem confinadas e
isoladas em casas totalmente interiores e minúsculas. Hoje, esse tipo de
construção se tornou uma norma comum nas cidades, que também parecem planejadas
para obrigar os cidadãos (ou produtos) a investirem muito tempo para chegar ao
seu destino, tanto em transportes públicos como privados. São cidades baseadas
em economias de escala, cuja produção é frequentemente centralizada por meio de
fábricas remotas obsoletas.
Tendo desenhado o diagrama do
comportamento do vírus e sua propagação nas cidades, percebemos que, além de
uma crise de saúde, o que vivemos hoje é também uma crise de design. Os
imprevistos problemas sociais e de saúde que nosso mundo enfrenta hoje e os
desafios sociais e econômicos adicionais (provavelmente mais sérios) que
enfrentaremos durante e após a recuperação da saúde nos incitam a repensar e
reestruturar muitas das tradições de design de edifícios e da própria cidade,
bem como as bases sobre as quais operaram nas últimas décadas. Repensar o
design combinando-o com a ciência multidisciplinar para priorizar a qualidade
de vida das pessoas é um caminho poderoso de fazer a arquitetura inovar e,
portanto, gerar mudanças e um impacto positivo no ambiente construído e a
sociedade que o habita.
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A atual pandemia nos mostrou que depender de sistemas
externos não é sustentável nem resiliente. O ambiente
construído deve ser mais autossuficiente na produção dos
recursos de que
necessita
Biologia e natureza como
modelo
Se você aprender com a biologia
(sintética) e a própria natureza, o projeto arquitetônico pode inovar
redefinindo o ambiente construído e as cidades como organismos vivos;
organismos que podem filtrar o ar, autorregular sua própria temperatura ou
fornecer altos níveis de oxigênio e ventilação de qualidade. Se considerarmos
que, em todo o mundo, cerca de sete milhões de mortes por ano são atribuídas
aos efeitos conjuntos da poluição do ar na casa e no meio ambiente, apelamos ao
projeto arquitetônico para que redefina o desempenho dos edifícios e da cidade
e comande uma mudança positiva, não só na qualidade espacial, mas também no
bem-estar físico dos seus habitantes.
Existem mais funções biológicas
que podemos adicionar ao nosso ambiente construído, como a produção de recursos
dentro de uma rede de nós interconectados. Prédios e cidades podem se tornar
fractais celulares hiper conectados, capazes de produzir e fornecer recursos
localmente, como alimentos ou energia, e distribuí-los entre as células. A
atual pandemia nos mostrou que depender de sistemas externos não é sustentável
nem resiliente. O ambiente construído deveria ser mais autossuficiente na
produção dos recursos de que necessita e mais inteligente na forma como usa
seus "subprodutos", como são os rejeitos. A natureza, por exemplo,
não reconhece a noção de “rejeição”; todos os produtos se tornam recursos para
outro sistema funcionar e viver. O ambiente produtivo construído torna-se,
portanto, um sistema vivo que opera em um metabolismo circular, impulsionado
pelos princípios de produção, reutilização e ciclo ascendente de recursos.
A aposta por materiais
naturais e orgânicos
Dado o fato de que nossos
edifícios atuais são os principais poluentes de CO2 e consumidores
de energia, e que o setor de construção é o principal gerador de resíduos no
mundo, a arquitetura é instada a redefinir o metabolismo de edifícios e
cidades. Se você aprender com a ciência dos materiais, o design arquitetônico
pode promover a criação de ambientes interiores mais saudáveis, evitando
plástico, chumbo e outros materiais tóxicos tradicionalmente usados na
construção de interiores. Compostos bio, naturais e orgânicos novos ou
renovados (que incluem terra, biomassa, cerâmica e certos tipos de madeira)
podem melhorar a qualidade do ar interno e reduzir doenças respiratórias,
contribuindo para o resfriamento e aquecimento passivos, o que atenua,
portanto, a necessidade de aumentar a estanqueidade de interiores que, por sua
vez, pode ocasionar a concentração de ácaros do pó.
Em vez de materiais sintéticos
altamente projetados, precisamos insistir em um novo paradigma para materiais
de construção derivados de recursos naturais ou criados por fluxos de resíduos
orgânicos, que podem ser transformados em novos recursos para criar produtos de
engenharia civil e arquitetura que contribuam para uma nova cadeia de valor
onde os resíduos ou o conteúdo orgânico são os principais recursos. Devemos
também prestar mais atenção aos artesãos locais ou às comunidades de
fabricantes e makers que estão contribuindo para a criação de uma
variedade de “receitas” e técnicas de DIY, (“do it yourself” ou faça você
mesmo) para produzir novos compostos reciclados ou de base naturais e bio. Potencializados
pela cultura do código aberto e da Internet, os indivíduos e as comunidades
locais podem personalizar essas novas bibliotecas de materiais para construir
seus próprios refúgios de produtos "circulares".
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Algoritmos e inteligência coletiva,
ferramentas de planejamento
Finalmente, pode-se aprender com
a ciência de dados e as ciências sociais. O design arquitetônico e a análise
urbana podem integrar modelos estatísticos e algoritmos para prever fenômenos,
incluindo epidemias ou desastres naturais, entre outros. A Internet das Coisas,
tecnologias de sensores e aplicativos móveis tornaram-se ferramentas essenciais
durante a crise pandêmica para monitorar, prever e prevenir focos de vírus. E
também podem prever outras crises, como a climática. Em uma sociedade digital
acelerada, os dados coletados de bilhões de dispositivos e nossas impressões
digitais são o combustível mais valioso para impulsionar os motores do
planejamento sustentável.
Mas aprenderemos ainda mais se
observarmos e analisarmos a inteligência integrada nas decisões desorganizadas
dos usuários em nosso ambiente construído. Ao sobrepor dados quantificados com
dados qualitativos dos desejos das pessoas, podemos planejar soluções com base
nas necessidades reais dos cidadãos em face do nosso futuro ambiente urbano.
Assim, precisamos investir em modelos de design de inteligência coletiva que
vão além da inteligência cognitiva ou artificial. A combinação de big data,
inteligência artificial e inteligência coletiva (crowd intelligence)
abre possibilidades únicas para cocriação e planejamento centrados no ser
humano e impulsiona designs adaptativos e em tempo real que atendem tanto
às pessoas como para criar estratégias de resiliência no entorno em que
habitam.
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O design e o planejamento devem fazer as perguntas apropriadas
para ter um impacto positivo radical na maneira como vivemos e
interagimos.
Somos agora instados a mudar a
noção de materialização, gestão e construção de nosso ambiente construído. O
conceito de “cidades e edifícios duradouras e de consumidoras” deve dar lugar
a espaços construídos que produzem, gestionam e reaproveitam ou transformam
recursos, e que operam em simbiose com seus usuários e o meio ambiente. Também temos
pressa em interpretar a atual crise sanitária como uma crise de design, com
criatividade e inovação no epicentro de nosso ambiente construído e de nossas
cidades. As cidades e edifícios que planejamos e construímos hoje moldam os
cidadãos e a sociedade. Em vez de explorar apenas estratégias e tecnologias
para prever surtos ou vigiar a sociedade, o design e o planejamento precisam
buscar inovação e fazer as perguntas certas para ter um impacto radicalmente
positivo na maneira como vivemos e interagimos hoje, e especialmente pensando
no amanhã.
O design e as tecnologias
multidisciplinares tornam-se aqui aliados numa batalha sem precedentes para
restaurar os efeitos do impacto da nossa construção em um mundo o qual, por seu
turno, está a mudar a velocidades nunca antes concebidas.
Referências bibliográficas
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Recursos
digitais
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Ecology, Illa de Wight, consultat el 4 de febrer de 2020.
Directiva 2010/31/UE del Parlament
Europeu i del Consell,
relativa a l’eficiència energètica dels edificis, Diari Oficial de la Unió
Europea, consultado el 4 de fevereiro de 2020.
Traduzido por paulo celso da silva com autorização expressa da autora,
Dra.Areti
Markopoulou
O texto original em catalão pode ser lido em : https://www.barcelona.cat/metropolis/ca/continguts/ciutats-que-aprenen-de-la-ciencia-la-resposta-una-crisi-de-disseny
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